quarta-feira, 1 de junho de 2011

O Texto Integral da Petição

Exmº Senhor
Presidente da Assembleia da República
Os professores de Geografia e História subscritores desta Petição Pública Nacional solicitam à Assembleia da República a revogação do nº 11 do Anexo do Decreto-Lei nº 43/2007, de 22 de fevereiro, que aprova o Regime Jurídico para a Docência na Educação Pré-Escolar e nos Ensinos Básico e Secundário, onde se determina que o grau de mestre em Ensino de História e de Geografia constitui habilitação profissional para a docência das disciplinas de História (Grupo de Recrutamento 400) e de Geografia (Grupo de Recrutamento 420). Em sua substituição, pedem que a habilitação profissional para a disciplina de História passe a ser concedida pelo grau de mestre em Ensino de História e que a habilitação profissional para a disciplina de Geografia seja concedida pelo grau de mestre em Ensino de Geografia.
Na discussão pública do Regime Jurídico, a unificação da formação inicial dos professores de Geografia e de História foi fortemente contestada por professores e instituições sócio-profissionais e académicas representativas. Até então, a formação inicial destes docentes para o 3º ciclo do ensino básico e para o ensino secundário era efetuada nas universidades através de um percurso de formação de 5 anos (seguindo o modelo da licenciatura em ensino) ou de 6 anos (licenciatura de 4 anos e ramo de formação educacional de 2 anos), em Geografia ou em História. Nestes percursos, cerca de dois anos eram de formação em Ciências da Educação e Didática, pelo que a formação científica específica, em Geografia ou em História, era aproximadamente de 3 ou 4 anos, conforme se tratasse do primeiro ou do segundo modelo.
Com o Processo de Bolonha, passou a ser exigido o nível de Mestrado para a habilitação profissional para a docência, o que é justificado pelo “esforço de elevação do nível de qualificação do corpo docente com vista a reforçar a qualidade da sua preparação e a valorização do respetivo estatuto sócio-profissional.”[1].
O regime jurídico aprovado em 2007 determina a unificação da formação inicial dos professores das disciplinas de Geografia e de História, no Mestrado em Ensino de História e de Geografia. Ao mesmo Mestrado podem aceder todos os licenciados com um mínimo de 120 créditos no conjunto das duas áreas disciplinares e nenhuma com menos de 50 créditos (Referência 11 do Anexo).
Um semestre totaliza 30 unidades de crédito e uma unidade curricular semestral mobiliza, habitualmente, 6 créditos. Assim, pode ingressar no Mestrado em Ensino de História e de Geografia, que habilita para a docência, em simultâneo, de ambas as disciplinas, qualquer licenciado que possua apenas 2 anos de formação universitária em Geografia e em História (120 créditos), podendo ter numa das áreas uma formação inferior a um ano (50 créditos). Na melhor das situações, os diplomados que ingressem neste Mestrado com os cursos de licenciatura entretanto criados para o efeito, terão cerca de 2 anos de formação numa das áreas (major) e um ano de formação na segunda área disciplinar (minor). Esta formação científica específica será complementada no próprio Mestrado com uma ou, no máximo, duas unidades curriculares semestrais (Formação na Área da Docência).
Não está em causa o esforço e empenho dos alunos e professores que, nas universidades, presentemente participam no modelo de formação inicial imposto em 2007 (alguns dos quais promovem esta Petição Pública). Mas será possível ser-se bom professor de Geografia ou bom professor de História, ficar-se habilitado a lecionar qualquer uma das duas disciplinas, do 7º ao 12º ano, com uma formação académica disciplinar de apenas 1 ou 2 anos? Seguramente que não!
Não se pode ensinar bem em áreas de que se tem uma formação escassa. O presente modelo de formação inicial é atentatório da dignidade das disciplinas de Geografia e de História e do próprio ensino, mais em geral. Em Portugal, a desvalorização dos professores e da própria educação está, invariavelmente, associada a uma “simplificação” da formação inicial. Infelizmente, no Decreto-Lei nº 43/2007 não é apresentada qualquer justificação para a unificação da formação inicial dos docentes de Geografia e História, nem se conhecem quaisquer explicações públicas dos responsáveis por esta decisão. Sublinhe-se, ainda, o desfasamento entre este modelo de formação e o funcionamento do sistema escolar: os grupos de recrutamento de docentes são autónomos e lecionam disciplinas diferentes.
Na Petição/Manifesto “História, democracia e desenvolvimento”, da iniciativa da Direção da Associação dos Professores de História e de outras entidades, entregue na Assembleia da República em 14 de março de 2011, e no Parecer “Alterações Curriculares – 3º Ciclo”, da Associação de Professores de Geografia, datado de 10 de julho de 2010, as duas Associações manifestaram a sua preocupação com o atual modelo de formação inicial dos professores de História e de Geografia, fazendo referências explícitas ao Decreto-Lei nº 43/2007.
Com a presente Petição, os professores de Geografia e de História pretendem retomar a autonomia da formação inicial, indispensável para garantir a qualidade da formação inicial dos grupos de docência a que pertencem. Naturalmente, deverão ser salvaguardados os direitos dos docentes recém-habilitados ou que se venham a profissionalizar com o Mestrado em Ensino de História e de Geografia e que poderão optar por lecionar uma ou outra área disciplinar.
Os professores portugueses de Geografia e de História, diplomados numa destas áreas e docentes em qualquer grau de ensino, unem-se nesta Petição Pública Nacional, que testemunha tanto a sua oposição a medidas avulsas e atentatórias da qualidade da formação e dignidade profissionais como o seu empenho na construção de uma educação de qualidade.
Confiamos na melhor atenção e no devido acolhimento do Sr. Presidente da Assembleia da República e dos senhores deputados a esta Petição Pública Nacional.

Sérgio Claudino, IGOT, Universidade de Lisboa (Geografia);
Maria Leonor Carvalho, AE de Frei Estevão Martins/Alcobaça (História);
António Fernando Silva, AE da Quinta do Conde (Geografia);
Miguel Barros, Escola Secundária c/ 2ª e 3º ciclos de Passos Manuel/Lisboa (História);
Emília Sande Lemos, presidente da Associação de Professores de Geografia
Raquel Pereira Henriques, presidente da Associação de Professores de História
Margarida Pereira, presidente da Associação Portuguesa de Geógrafos

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